sábado, 19 de março de 2022

Escorregador, balanço e gangorra.

          
 
          
 
 
 
 
          Quando entrei na escola com cinco anos de idade era tímido e bem reservado, tinha amigos, mas não muitos, e encarar uma escola grande foi meio aterrorizante, mas sobrevivi, entre uma esquiva de bullying aqui e uma amizade ali. Me marcou a praça onde fazíamos o recreio, era grande, possuía diversos brinquedos: escorregadores, balanços e gangorras. Era um espação. Já adulto, quando a revi notei que não era tão grande assim.
          No primeiro recreio da escola fui até lá e estava cheia de crianças da minha idade, correndo, gritando, muitos já se conheciam de anos anteriores, eu era novato e ainda sem uma turma de amigos que fui pertencer nos dias seguintes, os colegas de aula. Lembro do cheiro que havia no ar, era início de março e alguma flor ou árvore estava em floração, até hoje quando sinto esse cheiro sou remetido aquela época, aos meus primeiros dias de aula, e não há como evitar, a lembrança é avassaladora.
          Da janela da minha casa, hoje, vejo uma pracinha. Está há uns 200 metros de distância, nela crianças brincando, correndo, rindo, entre gritos fininhos e infantis, algumas jogam bola, mas a maioria brinca nos escorregadores, balanços e gangorras, consigo ouvir algo de lá quando o movimento da cidade fica mais calmo, no meio da tarde, início da noite ou nos finais de semana e o ruído diminui.
         A cada ida e vinda do balanço na praça o mesmo ruído, metálico, agudo, repetitivo, de junções metálicas que não recebem lubrificação há um bom tempo ou lubrificação que o clima inclemente de sol e chuva já removeu. Ruído inconfundível. Não tenho controle. Sou enviado aos meus primeiros dias de aula quando ouvia esse mesmo som, e não só à aula, à minha infância onde este som era presente sempre, porque eu estava seguido na rua ou em uma praça brincando, em um tempo em que isso era o mais comum para uma criança e seus amigos, menos perigoso e sem supervisão adulta.
          Este som é o que mais representa a infância e o que dela deveria ficar: a brincadeira, a turma de amigos, a falta de compromisso com as horas, uma despreocupação com a vida. Às vezes me paraliso na janela de casa ouvindo os sons do balanço da pracinha e viajo no tempo, lembrando da infância em uma trilha sonora gerada pelas crianças de hoje, que são muito ou pouco diferentes das crianças que convivi na infância, mas ainda crianças, que se divertem, brincam, riem, compartilham o que há de mais maravilhoso na infância que é ser criança.